Não disputo o poder e, para mim, ganhe este ou aquele, a vida segue a
mesma. Os petralhas ainda não conseguiram a minha cabeça na bandeja,
rodeada de cerejas e com uma maçã na boca, embora já tenham tentado
algumas vezes. Gostam de propor trocas indecorosas aos contratantes, até
agora rejeitadas.
Pouco afeitos ao trabalho duro, os companheiros ignoram que tenho outras
habilidades além de juntar coordenadas e subordinadas. E nenhuma delas é
executada de joelhos ou depende de patrocínio da Petrobras ou de
estatais que virarão, cedo ou tarde, caso de polícia.
E porque não disputo o poder, a irritação ou o gozo que me provocam a
política são, vá lá, puramente intelectuais. E, ora vejam, vou me
irritando ou gozando cada vez menos com ela. Para que algo excite a
nossa imaginação, é preciso haver "encantamento", palavra oriunda do
mesmo manancial semântico de que vêm o canto e o poema. Pesquisem.
Irrita-se aquele que se deixa estimular, excitar, que se sente
instigado. Encantamento e irritação são expressões benignas de
importar-se.
No meu próximo artigo, defendo o impeachment da Dilma. Neste,
permitam-me que expresse o tédio que essa gente provoca em mim. O tédio é
parente do ódio, mas se trata de uma aversão mais contida, mais serena,
mais preguiçosa. E me enfadam menos os donos do poder, que estão por aí
tentando achar uma saída, uma desculpa, uma trilha culposa que os livre
do dolo e da cadeia, do que seus escribas.
É possível que alguns estejam apenas ganhando a vida –fazer o quê? Essa
profissão existe, e eu defendo que seja regulamentada. Mas há também, e
são ainda mais patéticos, os que emprestam a sua pena à justificação da
bandalheira de olho apenas no soldo moral. Não querem se confundir com
os reacionários, ainda que possam se confundir com ladrões. Escolhas
morais.
De novo, para surpresa de ninguém, está na praça a tese do suposto
confronto entre "conservadores e progressistas", entre "golpistas e
legalistas", entre "nós e eles". E alguns articulistas se prestam ao
triste papel de tingir o nariz de marrom. Rui Falcão descobriu que
queremos mesmo, os maus, é privatizar a Petrobras, acabar com o regime
de partilha e pôr um fim à política de conteúdo nacional –aquela que já
provocou um edificante rombo de R$ 20 bilhões. Em nome do povo! Por isso
o seu partido denunciou, numa resolução, a conspiração da direita e
aproveitou para pregar o controle da "mídia".
José Eduardo Cardozo, que ficou mais magro com uma dieta argentina, mas
nem por isso passou a ter ideias mais severas –não leu Musil...–, acha
que não se deve usar a roubalheira na Petrobras para disputar um
terceiro turno. Segundo diz, só pessoas com "problema psicológico"
defendem o impeachment de Dilma. Tá.
Ele cansou de usar o direito como argumento. Perde! Prefere mandar o
oponente para o hospício. É uma tradição da escola de pensamento da qual
é oriundo. Este senhor tem ideias originais sobre investigação de atos
petistas desde o caso Lubeca, que já tem quase 30 anos. Era o ovo da
serpente.
Os companheiros ainda não perceberam que sua organização começou a
morrer. As valentias de um moribundo são sempre um espetáculo
melancólico. Quer falar de psicologia, Cardozo? O PT era uma neurose.
Agora é só uma necrose moral.
Reinaldo Azevedo, jornalista, é colunista da Folha e
autor de um blog na revista 'Veja'. Escreveu, entre outros livros,
'Contra o Consenso' (ed. Barracuda), 'O País dos Petralhas' (ed. Record)
e 'Máximas de um País Mínimo' (ed. Record). Escreve às sextas-feiras.
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