A história um tanto nebulosa das ameaças ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, confere ao ambiente político, já tão carregado de nuvens negras, um ar que oscila entre a dramaticidade e a incredulidade. Em qualquer caso, grave.
Tais ameaças teriam sido detectadas pela área de inteligência do governo
e justificado ao menos um encontro do ministro da Justiça com o
procurador, sem constar previamente da agenda e sem pauta específica. As
circunstâncias e os personagens embaralham ainda mais o drama.
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, já é protagonista desde que
se enrolou para explicar um encontro fora da agenda com um advogado da
UTC, empreiteira que está no centro da Operação Lava Jato. E o
procura-dor-geral da República está para entregar, vejam vocês, a lista
dos políticos envolvidos no maior escândalo da história, o da Petrobrás.
Uma dedução lógica, portanto, é que Cardozo pode muito bem ter ido até
Janot para tratar de Lava Jato, quem sabe dar uma espiada na lista, quem
sabe até demonstrar satisfação pela inclusão de uns, aborrecimento pela
de outros. Mas tudo isso são ilações.
Na primeira versão, oficial, o encontro foi para tratar das medidas
anticorrupção, aquelas que o governo anuncia de 15 em 15 dias, quando
não tem muito a acrescentar ao script. Na segunda, extra oficial, foi
para tratar da tal ameaça contra Janot, que estaria agora com o esquema
de segurança reforçado. Mas... livre para conversar também com o
vice-presidente Michel Temer, do PMDB, um dos partidos mais enrolados.
Cardozo e Janot são pivôs da queda de braço que ocorre nos bastidores
entre o governo e empreiteiras envolvidas na Lava Jato. A estratégia do
governo para a Lava Jato é tentar fechar uma confissão conjunta de
cartel das empreiteiras, tanto nas delações premiadas na Justiça quanto
nos acordos de leniência com a Controladoria-Geral da República.
Nessa hipótese, sonho do Planalto e do Instituto Lula, as investigações
seriam encerradas com a incriminação das empreiteiras, sem atingir PT,
PMDB, PP, as campanhas e os governos de Lula e Dilma. A corrupção seria
das empresas, não de um esquema político para eternizar o PT no poder.
Até aqui, a versão de um (mais um...) cartel de empreiteiras vem sendo
corroborada pelo site do Ministério Público e pelo trabalho do juiz
Sérgio Moro, que exclui os políticos das delações para não entregar os
desdobramentos para o foro privilegiado, o Supremo Tribunal Federal.
Resta saber, portanto, quais serão os próximos passos de Moro e do MP a
partir da divulgação da lista de políticos do agora ameaçado Janot. E
até que ponto os empreiteiros e os executivos trancafiados estão
dispostos a ceder e o quanto vão resistir à pressão inclusive, ou
principalmente, das famílias. Essa pressão de mulheres e filhos é para
que entreguem todo mundo, ponto final.
Nunca se deve menosprezar, porém, o "poder de convencimento" (com
ironia, por favor) das canetas e dos governos. As empreiteiras reclamam
que BNDES, BANCO DO BRASIL e Caixa Econômica
Federal fecharam as torneiras não apenas para elas, mas para seus
conglomerados. Faz uma diferença fenomenal, ou melhor, bilionária. A
construtora Odebrecht, por exemplo, é apenas um pedaço do Grupo
Odebrecht. Se uma quebrar, sobrevive-se. Se for a outra, é o fim do
mundo.
A pressão é para que os empresários e seus executivos assumam a tese de
cartel e deixem os responsáveis políticos em paz. Mas não dá nem para
apostar nisso e o governo dormir tranquilo, porque a qualquer hora
alguém pode botar aboca no trombone e explodir toda a estratégia de
Lula,Dilma,governo. Logo, há muito mais em jogo e muito mais gente sob
ameaça do que apenas Janot. Se é que ele efetivamente está.
As circunstâncias e os personagens Cardozo e Janot embaralham mais o drama
Estadão >ELIANE CANTANHÊDE |
Janot pode estar sofrendo ameaça velada e não um alerta!
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