20 fevereiro, 2015

Crise pós-Lava Jato paralisa obras de R$ 5 bi e causa demissões de 7.000


Atrasos em projetos, demissões e incerteza marcam a rotina de cidades pelo país que tiveram rápido crescimento com a instalação de estaleiros voltados à produção para a Petrobras.
Mas a crise nas empreiteiras afetadas pela Operação Lava Jato, da Polícia Federal, ameaça agora as promessas de desenvolvimento econômico acelerado.
Em três Estados –Rio Grande do Sul, Bahia e Espírito Santo–, os investimentos somam pelo menos R$ 5 bilhões e, em dois deles (Bahia e Rio Grande do Sul), o total de demissões chega a 7.000, segundo os sindicatos de trabalhadores.
Com economia modesta até 2006, Rio Grande, município de 207 mil habitantes no litoral gaúcho, conheceu o status de polo econômico do Estado após o início da construção de plataformas e módulos para a Petrobras a partir de 2006.
Shoppings foram erguidos e a construção civil passou por um boom, mas após a Lava Jato, o cenário se deteriorou rapidamente.
O sindicato dos metalúrgicos estima que foi demitida metade da força de trabalho da empreiteira Engevix, empresa que teve o vice-presidente preso na operação e que tinha sido contratada pela Petrobras para construir cascos para plataformas.
Empresas terceirizadas reclamam de dívidas pendentes e também demitem –ao todo, o sindicato fala em 2.500 cortes. Aos operários dispensados restou procurar emprego no comércio local. Mas os lojistas também dizem enfrentar reflexos da situação e queda nas vendas.
Na última quinta-feira (12), uma série de protestos foi promovida pelo sindicato dos metalúrgicos na cidade, com o fechamento de rodovias e greve de ônibus.
A incerteza também paira sobre dois projetos que seriam a base da economia local nos próximos anos: a construção das plataformas P-75 e P-77 por um consórcio liderado pela Queiroz Galvão. O início dos trabalhos vem sendo adiado sucessivamente desde 2013 e não há uma garantia de quando sairá do papel.
MEGA SEM O PRÊMIO
Na Bahia, o cenário também é de insegurança no estaleiro em Maragogipe, cidade de 46 mil habitantes a 130 km de Salvador. Os trabalhos no complexo são em duas frentes: na construção da estrutura do estaleiro e também na montagem de sondas de perfuração. O investimento previsto no local era de R$ 2,7 bilhões.
Nos últimos meses, segundo informações do próprio consórcio responsável, 4.500 pessoas foram demitidas no complexo, tanto na obra física quanto na área das sondas.
Os equipamentos tinham sido encomendados pela Sete Brasil, parceira da Petrobras e investigada na Lava Jato. O consórcio é composto por empresas como a OAS e UTC Engenharia –também envolvidas na operação.
O sindicato dos trabalhadores fala que há um risco de a obra virar um "elefante branco".
"A cidade passou 50 anos sem esperanças até a chegada do estaleiro. Agora, é como alguém que ganhou na Mega Sena e não recebeu o prêmio", diz o secretário municipal Gilberto Sampaio.
No Espírito Santo, a crise da Sete Brasil também atrapalha o início das atividades de um complexo criado para a construção de navios-sonda. O estaleiro, administrado pela empresa de Cingapura Jurong, levou o município de Aracruz a se tornar um dos que mais geraram empregos na indústria no país em 2014.
No começo do mês, o responsável pela operação da companhia na América do Sul, Martin Cheah, disse ao jornal "Valor Econômico" que o atraso nos pagamentos da Sete Brasil provocaria demissões e obrigaria sua empresa a ir à Justiça.
Procurada pela Folha, a Jurong informou apenas que as atividades estão normais e que não faz comentários sobre inadimplência. Já a Petrobras disse que está em dia com suas obrigações e que os pagamentos às empresas continuam de acordo com o que tinha sido estabelecido nos contratos. Mas afirmou também que "revê sistematicamente" projetos em andamento como forma de preservar o caixa e viabilizar seus investimentos.
A VISÃO DAS EMPRESAS SOBRE A CRISE
A Sete Brasil informou que trabalha para concluir a contratação de linhas de crédito junto ao BNDES e que está "o tempo todo" em negociação com os estaleiros. Afirmou ainda que o seu plano de construção de 29 sondas em cinco diferentes complexos do país deve gerar 120 mil empregos diretos e indiretos.
O consórcio Enseada, que atua em Maragogipe, afirma que a indústria naval atravessa um período de "dificuldade" e que o complexo passou por um "desaquecimento" em seu processo de construção. Mas diz que as encomendas seguem sendo montadas e que o investimento é um dos maiores da Bahia nos últimos anos.
A Engevix nega que tenha ocorrido "demissão em massa" no estaleiro de Rio Grande. Diz que a construção dos cascos de plataformas segue etapas que "exigem um número maior ou menor de funcionários" e que as "movimentações de pessoal" estão ligadas a esse processo. Também afirmou que um dos projetos já foi concluído no ano passado e que outros dois estão com mais de 75% prontos.


FOLHA


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