31 janeiro, 2015

A pergunta que não quer calar

Antigamente, a rapina ao patrimônio público era ação de indivíduos, solitária ou em pequenas quadrilhas. Hoje, é sistêmica e se dá na casa dos bilhões
A ruína do projeto político do PT – e o governo Dilma é sua mais eloquente síntese e tradução - dá-se em meio ao silêncio de entidades da sociedade civil, que, ao longo da história contemporânea, tiveram amplo protagonismo na cena pública.

Onde estão a OAB, a ABI, a UNE e a CNBB, entre outras siglas que se associaram à história da reação popular aos maus governantes? – eis a pergunta que não quer calar.

No momento em que a corrupção sistematizada, comandada de dentro do Estado, apresenta sua conta – Mensalão, quebra da Petrobras, violação da Lei de Responsabilidade Fiscal, falência da economia -, é no mínimo ensurdecedor o silêncio de quem sempre soube falar tão alto em momentos de crise e de má governança.

O final do governo militar deveu-se a uma conjunção de fatores, que se resumem na falência de seu modelo econômico e na falta de representatividade de seu modelo político.

Foram essas entidades que romperam a mordaça da repressão, articularam a sociedade e levaram às ruas o “basta” da população. Exerceram, naquela oportunidade, uma vigilância cívica decisiva para que o país se reencontrasse com a democracia.

Mas essa vigilância, que prosseguiu nos primeiros governos civis – os de Sarney, Collor, Itamar e FHC -, começou a minguar até desaparecer por completo desde a posse de Lula, festejada por elas  como se o país, enfim, tivesse chegado ao Paraíso.

O que se constata é que, a exemplo do que aconteceu com o próprio Estado brasileiro, essas entidades foram mutiladas na sua essência. Transformaram-se em células partidárias, corresponsáveis pelo projeto político em curso, de índole revolucionária.

A lógica revolucionária, como se sabe, é a da ruptura, que começa por dividir a sociedade e a colocá-la em conflito. Promove o caos e depois acena com a ordem totalitária para consertar o que ela mesmo quebrou. O país está em meio a esse processo.

O projeto do PT postula uma “sociedade hegemônica”, que é o avesso de uma sociedade democrática, em que o poder se alterna entre os diversos partidos que se organizam para exercê-lo. Numa sociedade de pensamento único, não cabe a liberdade de imprensa, o que explica a obsessão petista por controlar a mídia.

Esse projeto de poder, gestado no Foro de São Paulo – entidade criada por Lula e Fidel Castro em 1990, para reunir as esquerdas do continente em torno de um projeto único de poder, a Grande Pátria -, já está em estágio mais avançado em países vizinhos, menos complexos que o Brasil.

Temos então a oportunidade de contemplar etapas pelas quais ainda não passamos, mas que, mantidas as ações em curso, fatalmente passaremos. E isso explica as dimensões estratosféricas da rapina petista ao Estado brasileiro.

Não foi o PT que inventou a corrupção, mas nada nem ninguém a elevou ao patamar em que se encontra. E o que temos corresponde apenas a um início de devassa numa única estatal. Como disse Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras, o que lá se fez também se fez nas demais estatais, ainda não investigadas.

Antigamente, a rapina ao patrimônio público era ação de indivíduos, solitária ou em pequenas quadrilhas. Hoje, é sistêmica e se dá na casa dos bilhões. Para onde foi esse dinheiro, que se tem por irrecuperável? Se só um gerente, Pedro Barusco, braço direito do Renato Duque, operador do PT na estatal (e que está solto), se dispôs a devolver 100 milhões de dólares, quanto está em jogo?

Não apenas: se o rombo já constatado – e, repito, estamos falando de apenas uma estatal – chega quase a 90 bilhões de reais, pergunta-se para onde foi essa montanha de dinheiro. Ninguém acredita que o dinheiro que Barusco vai devolver era só dele.

A lógica indica que ele era um laranja. O dinheiro, guardado em conta no exterior, serve à causa, assim como os demais 88,6 bilhões que a própria Graça Foster admite não ser o total. O dinheiro é do Foro e serve aos interesses da Grande Pátria, de que falava Hugo Chávez, o projeto de unificação socialista do continente. É dinheiro demais até para um partido com a voracidade do PT. É destinado a um projeto geopolítico – afinal, revolução é verba -, cujos adeptos dominam hoje as principais entidades da sociedade civil.

Daí o silêncio cúmplice com que acompanham os maiores desmandos já registrados na História não apenas do país e do continente, mas do próprio mundo moderno, como registrou o The New York Times. Em que medida esse ideário psicótico afetou as instituições, sobretudo o Judiciário, teremos a oportunidade de ver, nos desdobramentos da Operação Lava-Jato.

Aguarda-se para depois do carnaval a denúncia do procurador geral da República, Rodrigo Janot, e o posicionamento do relator do processo no STF, ministro Teori Zavascki. Eles dirão em que estágio de subserviência e deterioração estão as instituições desta Sereníssima República.

Silêncio (Foto: Arquivo Google)

O GLOBO

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