É um privilégio neste momento crítico da política brasileira voltar a
este espaço que ocupei em 2011 e 2012. Já colaborei na Folha, em
cadernos e anos diversos, exercendo atividade diferente da que tenho
hoje. Tenho consciência da importância que foi chegar a milhares de
pessoas quebrando tabus, defendendo os direitos do povo, das mulheres e
minorias, avançando em temas de difícil aceitação.
Senadora, e com uma visão muito crítica da situação política brasileira,
sinto-me no dever de exercer neste espaço a audácia e transparência que
caracterizaram minha vida.
Em política existem duas coisas que levam a vaca para o atoleiro: a negação da realidade e trabalhar com a estratégia errada.
O governo recém-empossado conseguiu unir as duas condições. A primeira, a
negação das responsabilidades quando a realidade se evidencia. A
segunda, consequência da mentira, desemboca na estratégia equivocada.
Estas condições traduzem o que está acontecendo com o governo e o PT.
O começo foi bem antes da campanha eleitoral deslanchar. Percebiam-se os
desacertos da política econômica. Lula bradava por correções. Do
Palácio, ouvidos moucos. Era visto como um movimento de fortalecimento
para a candidatura do ex-presidente já em 2014. E Lula se afasta. Ou é
afastado. A história um dia explicará as razões. O ex-presidente só
retorna quando a eleição passa a correr risco.
Afunda-se o país e a reeleição navega num mar de inverdades, propaganda
enganosa cobrindo uma realidade econômica tenebrosa, desconhecida pela
maioria da população.
Posse. Espera-se uma transparência que, enquanto constrangedora e
vergonhosa, poderia pavimentar o caminho da necessária credibilidade.
Ao contrário, em vez de um discurso de autocrítica, a nação é brindada
com mais um discurso de campanha. Parece brincadeira. Mas não é. E tem
início a estratégia que corrobora a tese de que quando se pensa errado
não importa o esforço, porque o resultado dá com os "burros n'água".
Os brasileiros passam a ter conhecimento dos desmandos na condução da
Petrobras. O noticiário televisivo é seguido pelo povo como uma novela,
sem ser possível a digestão de tanta roubalheira. Sistêmica! Por anos. A
estratégia de culpar FHC (não tenho ideia se começou no seu governo)
não faz sentido, pois o tamanho do rombo atual faz com que tudo pareça
manobra diversionista. Recupera-se o discurso de que as elites se
organizam propagando mentiras porque querem privatizar a Petrobras.
Valha-me! O povo, e aí refiro-me a todas as classes sociais, está
ficando muito irritado com o desrespeito à sua inteligência. Daqui a
pouco o lamentável episódio ocorrido com Guido Mantega poderá se
alastrar. Que triste.
Marta Suplicy é senadora pelo PT-SP e ex-prefeita de São
Paulo. Foi ministra dos governos Luiz Inácio Lula da Silva (Turismo) e
Dilma Rousseff (Cultura).
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