A forte queda da popularidade da presidente Dilma Rousseff neste
primeiro trimestre deve-se à percepção pela população de que foi
enganada. A presidente teve que desfazer cada uma das promessas feitas
ao longo da campanha e tomar o caminho que falara que seria tomado pelos
seus adversários.
Como argumentei há algumas semanas, o estelionato eleitoral de Dilma é
qualitativamente diferente da alteração do regime cambial na virada de
1998 para 1999.
Do ponto de vista das regras de funcionamento da democracia, não há
problemas. Estelionato faz parte do jogo. Se houver retomada da
economia, haverá tempo suficiente para a recuperação da popularidade. O
forte crescimento já em 2000 promoveu a recuperação da popularidade de
FHC e, provavelmente, Serra somente não foi eleito em 2002 em razão da
forte desaceleração da economia em 2001, fruto do racionamento
energético.
No entanto, as implicações para o jogo da política no Congresso Nacional
de tal estratégia não tinham sido previstas pelo comando de campanha
petista ao definir o estelionato como o recurso maior da estratégia de
campanha.
No início do mês, o presidente do Senado, Renan Calheiros, devolveu a MP
(medida provisória) que aumentava para diversos setores a alíquota da
contribuição sobre o faturamento para o financiamento da Previdência
Social.
O objetivo da MP é desfazer um erro que foi cometido no governo
anterior. A troca, para financiar a Previdência, da contribuição sobre a
folha de salários por contribuição sobre o faturamento com alíquota
menor gerou enorme perda de receita. Não há nem havia espaço fiscal para
avançarmos nas desonerações.
De fato, trabalho recente publi- cado no quarto fascículo do ano passado
da "Revista Brasileira de Economia", a mais conceituada publicação
acadêmica brasileira, in- titulado "A Substituição da Con- tribuição
Patronal para o Fatu- ramento: Efeitos Macroeconômicos, sobre a
Progressividade e Distri- buição de Renda no Brasil", documenta que não
há efeitos econômicos positivos da política. Em par- ticular, a política
não reduz as distorções de nosso complexo sistema tributário. Faz todo o
sentido desfazer a desoneração.
O problema é que o Senado havia aprovado no dia 29 de outubro do ano
passado a medida provisória que o ministro Mantega enviara ao Congresso
Nacional em julho, tornando permanente a desoneração da folha.
Evidentemente a aprovação da MP envolveu algum tipo de negociação
política.
O que exatamente ocorreu entre o fim de outubro e fevereiro que justifique desfazer o que foi feito?
O mesmo ocorre com a aprovação na Câmara, na terça-feira passada, do
projeto de lei que obriga a União em um mês a assinar aditivos
contratuais de alteração do indexador das dívidas dos Estados e
municípios.
A alteração do indexador foi aprovada no início de novembro no Senado e
foi sancionada pela presidente em 26 de novembro. A presidente poderia
ter vetado. O que ocorreu entre 26 de novembro de 2014 e agora que
justifique a não regulamentação da lei complementar aprovada no fim do
ano?
A menos que acreditemos que a presidente não conhecia a real situação
das contas públicas do país, talvez encantada pelas mágicas do
secretário do Tesouro Arno Augustin, não houve alteração apreciável da
situação fiscal de lá para cá.
O jogo do Executivo de "agora vota A" e quatro meses depois "agora vota o
oposto de A" é tratar o Congresso como marionete. A presidente terá que
fazer mais política para explicar aos congressistas os motivos que
explicam "A" seguido do "oposto de A".
João Santana, em entrevista ao jornalista Luiz Maklouf Carvalho no livro
"João Santana – Um Marqueteiro no Poder", da editora Record, afirma que
não é possível traçar linha clara entre manipulação e informação
política. De fato, é difícil haver critérios objetivos que permitam essa
distinção.
O que talvez não constasse do cálculo do marqueteiro é a conta que fica para o dia seguinte de estelionato dessa dimensão.
Como afirmava Marina Silva, não é bom ganhar perdendo. Não é bom para o
governo e não é bom para o país. A conta do estelionato ficou cara
demais.
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