No início de 2015, o governo Dilma Rousseff parecia desconsiderar que
passos simples poderiam reverter as críticas relacionadas à timidez de
nossa política externa e, com razão, à falta de transparência,
participação e compromisso com os direitos humanos na diplomacia.
Hoje, em janeiro de 2019, a ex-presidente pode rechaçar os rótulos do passado.
A volta por cima começou logo no primeiro mês do segundo mandato, com a publicação do Livro Branco da política externa.
Apesar da limitada participação social no processo de elaboração, o
documento final estabeleceu diretrizes concretas para nossa ação
internacional e, estrategicamente, elegeu a transparência como marca
fundamental do novo Itamaraty.
Prova disso é o diálogo que o governo estabeleceu com o Conselho
Nacional de Política Externa depois de sua criação, ainda naquele ano.
Essas duas iniciativas, coerentes com a ideia de que uma democracia
efetiva depende de controle social, impulsionaram as transformações que
viriam a seguir.
Meses após o início do segundo mandato, Dilma conseguiu acelerar a
ratificação do Tratado sobre o Comércio de Armas, que tramitava no
Executivo e no Legislativo havia quase dois anos.
O tratado passou a controlar as transferências internacionais de
armamentos, passo fundamental para reduzir as mortes violentas no mundo
-mazela que atinge o Brasil com especial gravidade.
Essa mesma legislatura enterrou o malfadado Estatuto do Estrangeiro,
criado na ditadura, e aprovou a nova Lei de Migrações, trocando o antigo
paradigma da segurança nacional pela perspectiva dos direitos humanos.
O país também aperfeiçoou e ampliou a política de vistos humanitários, antes aplicada apenas a haitianos e sírios.
Em outro gesto humanitário, coerente com as críticas à existência da
prisão americana de Guantánamo e acompanhando a iniciativa do Uruguai, o
Brasil deu refúgio a dez homens presos na ilha sem acusação formal.
Superado o imbróglio da redução orçamentária do Itamaraty, outra face da questão emergiu: a racionalização no uso dos recursos.
Alocando seus meios de forma estratégica, o Brasil ampliou seu
protagonismo nos foros internacionais -como no caso da Organização dos
Estados Americanos.
Desde 2015, destinamos uma média anual de US$ 800 mil dólares à Comissão
Interamericana de Direitos Humanos, fortalecendo o principal órgão de
monitoramento de violações na região. O último aporte, em 2009, havia
sido de apenas US$ 10 mil.
As mudanças na relação com o Sistema Interamericano não foram apenas de
ordem financeira. O país surpreendeu ao decidir aplicar integralmente as
sentenças e recomendações internacionais pendentes, como no caso do
presídio maranhense de Pedrinhas e da guerrilha do Araguaia.
A atitude do Brasil na ONU também mudou. Lembremos do apoio de nossa
diplomacia à proposta de fim de veto, no Conselho de Segurança, em casos
de genocídio e crimes contra a humanidade.
O mesmo protagonismo se materializou no Conselho de Direitos Humanos,
onde patrocinamos iniciativas ousadas, como uma resolução sobre drogas.
Longe de ser assunto para diplomatas em Genebra, a medida abriu caminho,
aqui no Brasil, para a revisão da antiga e fracassada política de
drogas -até então, principal ferramenta de encarceramento em massa no
país.
Olhando para trás, vemos que a política externa brasileira em direitos humanos mudou muito, ainda que haja espaço para mais.
Fica claro, também, que avanços significativos não demandam mais do que
vontade política para aproximar o discurso diplomático da prática -e
Dilma e o Itamaraty provaram conhecer a receita.
CAMILA ASANO, 30, coordenadora de Política Externa da Conectas é
bacharel em relações internacionais e mestre em ciência política, ambas
pela USP
LAURA WAISBICH, 27, assessora de Política Externa da Conectas, é
bacharel em relações internacionais pela PUC-SP e mestre em ciência
política pelo Instituto de Estudos Políticos-Sciences Po
FOLHA
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