A imprensa parece ter acordado para a maior tragédia ambiental em curso
nesta região do planeta, a destruição acelerada da Amazônia. Mas talvez
agora já seja tarde demais: há fortes sinais de falência do sistema amazônico, que inclui a floresta e sua influência sobre o clima continental.
O rompimento desse complexo climático tem relação direta com a falta de chuvas no Sudeste e as cheias em Rondônia; o aumento do calor em São Paulo e redução do rio São Francisco; a desertificação do norte argentino e a violência de ventos e chuvas no Atlântico, colocando em risco as linhas aéreas entre Brasil e Europa.
O que atrai a imprensa para a questão, além do estelionato eleitoral cometido pelo Inpe (omitindo estatísticas para beneficiar o governo), é o prejuízo econômico causado pela seca. A maior parte da riqueza do Brasil, gerada no Sudeste, depende das águas levadas da Amazônia pelos ventos durante seis meses do ano (esta época que vivemos agora, primavera e verão); se a água não chega, o país inteiro se empobrece.
O PIB da Amazônia é negativo: a região recebe mais recursos da União do que gera com a destruição de recursos naturais para gerar produtos de baixo valor agregado como madeira, gado e soja. Mesmo a Zona Franca de Manaus é insustentável sem incentivos fiscais. O dinheiro que Brasília despeja no Norte é arrecadado no Sul e Sudeste do Brasil. Com uma crise climática sem precedentes, esta região perde a capacidade de gerar os impostos que sustentam aquela. É necessário usar os fundos públicos para alterar rapidamente o atual padrão de desenvolvimento da Amazônia.
Os Estados Unidos têm a maior economia do mundo e a Califórnia é seu Estado mais rico (seu PIB é semelhante ao do Brasil). Grande parte da água que consome vem do degelo das montanhas de Estados vizinhos. A Califórnia paga para captar e eles preservam o ambiente, com atividades econômicas não destrutivas. Assim, o Colorado tira do turismo 80% do PIB estadual (a agropecuária corresponde a 1%).
Mas, no Brasil, o governo federal usa impostos que arrecada no Sudeste para incentivar a destruição da floresta. É um suicídio consistente, há vários anos em processo galopante.
Já não é de hoje: no dia 11 de agosto de 2011, Manaus teve umidade relativa do ar de 18%, a menor em cem anos, índice semelhante ao de regiões do Saara. A grande floresta úmida ter ar seco como no maior deserto deveria chamar atenção de todo mundo. Mas a imprensa brasileira não viu. Ao final daquele ano, escrevi um artigo para Folha com o título que repito acima.
A imprensa tem dificuldades de lidar com temas complexos como o clima amazônico, prefere polaridades: preto no branco, esquerda e direita. No primeiro turno, quando o Inpe divulgou relatório que escondia há meses, os jornais não perceberam a gravidade dos dados. A Folha nem publicou o resultado. O silêncio permitiu à presidente Dilma vangloriar-se na ONU, dizer que houve só um "aumentinho" no desmatamento.
A agressividade do segundo turno tampouco ajudou: a questão ambiental ficou esmagada por dois candidatos desenvolvimentistas.
Como escreveu o filósofo alemão Gunther Anders, já em 1957, o fascínio pelo progresso nos faz cegos para o apocalipse. No caso do Brasil, essa cegueira vai nos matar de sede.
FOLHA>UOL
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