Não foram meses fáceis, acirrados por discussões e brigas que
pareciam se encerrar neste domingo, 26, com o término do segundo turno
das eleições presidenciais, mas não, elas ainda espirram ódios e
intolerâncias, mesmo passada a chamada tal “festa da democracia”. Para
as minorias, a palavra-chave chama-se tolerância, é esta a razão de
todas as lutas travadas por negros, mulheres, LGBTs, pessoas com
deficiência,… O que se leu e se ouviu foi o seu oposto, principalmente
quando a disputa ficou entre Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB). A
intolerância ganhou corpo de forma que ainda é extremamente
preocupante, mesmo passada a eleição.
Os primeiros passos foram dados na rede social e um sinal que a coisa
não estava indo bem foi quando uma amiga feminista postou algo
criticando Marina Silva (PSB) por ela ser religiosa. Depois de
criticada, ela usou o termo da liberdade de expressão para justificar os
seus atos, a mesma desculpa usada pelos humoristas machistas que ela
mesma critica. Algo muito errado estava começando a se desenhar.
Depois vieram o ódio e a eliminação do diferente também nas redes
sociais. Tudo bem dar “block” no Twitter ou no Facebook para quem está
fazendo bullying ou mesmo em quem você está achando um chato de galocha,
mas é muito estranho anunciar isto como foi feito em centenas de post.
“Agora sim, minha timeline está limpa, tirei todos que discordavam de
mim”, muita gente escrevia com orgulho e como prova de poder. O
exibicionismo egoico só prova uma coisa: a dificuldade com a alteridade,
com a diferença, e isto é um traço, mesmo que distante, usado em sua
radicalidade pelas ideologias fascistas.
Ao ver amigos brigando por ter opiniões divergentes, cheguei a
escrever no Facebook: “Em 1989, eu era petista desses de vender
estrelinha e estava apaixonado pelo sonho de um Brasil possível
desenhado pelo PT (não nego que tenho saudades daqueles tempos
utópicos). Fiz campanha, boca de urna pro Lula contra o Collor e vi
estarrecido o debate na Globo, o sequestro de Abílio Diniz e a derrota.
Quando soube que um amigo querido tinha votado no Collor, virei a cara
pra ele. Simplesmente o odiei, e isso foi por anos, não dirigia a
palavra a ele e fazia questão de virar o rosto. Bom, o tempo passou e
numa época que estava na pior, uma das pessoas que me deu a mão foi ele,
aquele que escrotizei pela opinião ‘política’ (fanatismo pior que o do
futebol, eu diria). Elegante, e muito distante da imagem que tinha de
quem votasse no Collor, nunca comentou nada de minha indiferença a ele
durante anos. Aliás, demorei pra voltar a falar com ele muito mais tempo
do que o Lula demorou para fazer aliança com Collor. [...] Hoje
acredito em áreas cinzas e na complexidade do ser humano, não consigo
acreditar que alguém é mau ou bom porque vota em tal candidato, acho
isto balela das grossas”.
Além das brigas sinalizando a intolerância, outro dado muito
semelhante aos estados totalitários foi a vigilância. Vigiar e punir (no
mínimo com um “block”) toda a diferença virou lei e orgulho nas redes
sociais. Os eleitores que preferiram não preferir, isto é, anulando o
voto ou se abstendo das eleições foram constantemente bombardeados.
Muito menos pela minha colega colunista da Folha, Mariliz Pereira Jorge,
que declarou que “nulo e branco é para os fracos” e muito mais por
acusações como “irresponsáveis e alienados” vociferados com constância
nas redes contra aqueles que se declaravam nesta posição.
Assim, o autoritarismo que gritava nas redes sociais se esparramou
para a vida. “Eu observei uma leviandade das lideranças políticas neste
momento que contribuíram para este fomento de um clima de guerra ou a
eclosão de um padrão fascista na internet. Eu acredito que as lideranças
têm muita responsabilidade nisto também. Pelo nosso próprio fascismo
latente individual, mas as lideranças potencializam e favorecem a
eclosão disto de uma forma mais evidente”, declarou, para o site “Uol”,
Rodrigo Leite, o psiquiatra da Hospital das Clínicas da USP, analisando
as eleições. Sua declaração foi completada pelo blogueiro Leonardo
Sakamoto: “O PT, para agregar o sentimento antitucano, e o PSDB, para
agregar o sentimento antipetista, trouxeram para perto de si o que há de
pior nos extremismos. Trouxe todo o lixo para perto”. Acredito que o
termo lixo para Sakamoto é sinônimo de intolerância e autoritarismo.
Independente de quem venceu as eleições, existe um sentimento de perda como Gregório Duvivier escreveu na Folha.
Fomos derrotados pela intransigência e o fanatismo. Foi a eleição que o
pensamento político perdeu de lavada para a publicidade e o marketing. O
emocional na política, importante ingrediente para o fascismo, mostrou
sua cara e suas unhas. E elas não foram aparadas depois do voto.
Já era, infelizmente, esperado o discurso de ódio contra os
nordestinos (será que querem fazer deles os novos judeus?). Entretanto,
diferente de 2010, quando uma estudante de direito de São Paulo atacou
os nordestinos, teve uma resposta firme e acabou até perdendo emprego
por causa de seu preconceito, desta vez, ele vem embalado de vozes mais
oficiais, como do vereador que se elegeu deputado estadual paulista que
sugere uma separação em Norte e Sul do país e de um comentarista de
televisão que referiu aos nordestinos como “bovinos”. O grande problema é
o discurso se sedimentar cada vez mais e se tornar uma “verdade” para
uma grande parcela da população. Contra isto, deve-se acontecer
respostas rápidas desautorizando a intolerância e o preconceito ( e não
incitando ainda mais o separatismo como muitos que dizem se opor contra o
ódio dos nordestinos e devolvendo insultos ao Sul do país como se tudo
fosse uma grande massa que pensasse de uma mesma forma = repetição de
grande parte dos discursos de ambos os eleitores dos dois candidatos na
rede).
Em contrapartida, uma jovem fez um vídeo declarando que com a vitória
de Dilma Rousseff, ela queria mudar de país, acabou tendo seu Twitter e
Facebook divulgado por dilmistas para receber bullying e ofensas. O
radicalismo e o autoritarismo foram alimentados como nunca nestas
eleições e agora estão em todas as instâncias, em menor ou maior grau. E
isto é extremamente nocivo para as minorias que veem o espírito
intolerante do brasileiro se aflorar com bastante ferocidade.
Que imagens tolerantes (raras, diga-se) como estas sejam mais
cultivadas como antídoto a algo muito perigoso que se aflorou nestas
eleições.
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