Confira na integra a entrevista que o diretor-superintendente da Previc, José Roberto Ferreira, concedeu ao repórter Murilo Rodrigues Alves, publicada no domingo, 31 de janeiro, no Jornal Estado de São Paulo.
Previc diz que agirá antes de porta ser "arrombada"
1/2/16 - Chefe do
órgão que fiscaliza fundos de pensão diz que regras vão mudar para
melhorar a governança de entidades de previdência complementar.
A Previc, órgão responsável pela
fiscalização dos fundos de pensão, mudou o modelo de supervisão para
chegar antes de a "porta estar arrombada", nas palavras do novo
diretor-superintendente, José Roberto Ferreira. O objetivo do órgão é se
antecipar para evitar que as irregularidades causem prejuízos aos
participantes e patrocinadores dos planos.
Em sua primeira entrevista, Ferreira
antecipou ao Estado que o governo vai modificar as regras para melhorar a
governança das entidades de previdência complementar. "Temos elementos
suficientes para avançar nesse sentido", afirmou. As negociações para
atualizar o marco, que é de 2004, estão sendo feitas com o Ministério do
Trabalho e Previdência Social e devem ser apresentadas ao Conselho
Nacional de Previdência Complementar (CNPC).
Entre as "boas práticas" que devem ser
incluídas nas regras está a orientação para que todo o sistema adote um
número mínimo de representantes nas diretorias. Atualmente, são poucas
as entidades que permitem essa participação mais democrática. E o caso
da Previ (dos funcionários do Banco do Brasil), que conta com dois
diretores eleitos pelos participantes e do Postalis, dos Correios, que
mudou recentemente o estatuto para incluir a prática.
Deve ser modificada a forma como são
escolhidos os órgãos máximos que administram os fundos. Hoje, é possível
que um mesmo grupo ocupe cargos nas três instâncias de decisão:
diretoria e conselhos deliberativo e fiscal. A diretoria é responsável
pela administração da entidade. Os dois conselhos devem ser a linha de
frente da fiscalização das ações dos membros da diretoria.
"Cada órgão não pode ter vinculação que
limite sua atuação. A formação de chapa única não favorece autonomia e
liberdade. Temos referência indicando que esse formato não oferece aos
participantes o resultado que se espera", defendeu.
Punição. A questão de
punição para o vazamento de informações privilegiadas também será
revista. O CNPC soltou resolução no fim de 2014 para reforçar o dever
dos dirigentes e conselheiros em guardar as informações dos
investimentos, da mesma forma como estão sujeitos a punições executivos
de companhias de capital aberto. Segundo Ferreira, mesmo assim, ainda
parece ao órgão regulador que a medida é insuficiente. Tal constatação é
baseada em reclamações dos participantes de que assuntos estratégicos
estão vazando para fora das entidades. "Naturalmente que, se uma
operação em curso vazar, pode interferir no preço e causar prejuízo ao
fundo de pensão", afirmou.
Para blindar os fundos de indicações
políticas, principalmente os patrocinados por empresas estatais, o
governo vai insistir em aumentar as exigências de qualificação para
habilitar os diretores e conselheiros. "Temos consciência plena de que
não cabe ao dirigente de um fundo de pensão nenhuma responsabilidade
menor do que a de dirigente de um banco", afirmou.
A Previc será responsável por habilitar
esses dirigentes, exigindo formação adequada, certificações oferecidas
por órgãos competentes e experiência na área. "Esperamos com tempo ter
um nível de aperfeiçoamento", disse. Segundo Ferreira, a Previc
regulamentará o processo de habilitação, aprovado pela CNPC, ainda no
primeiro semestre deste ano.
"Temos consciência de que não cabe ao
dirigente de um fundo de pensão nenhuma responsabilidade menor do que a
de dirigente de um banco."
"A formação de chapa única não favorece autonomia e liberdade."
(José Roberto Ferreira – diretor-superintendente da Previc)
Segundo novo xerife dos fundos de pensão, trabalho da Previc contribui para algumas das investigações da PF.
Das 317 entidades de previdência
complementar, a Previc mapeou as que estão mais propensas a apresentar
problemas e acompanha com lupa cada um dos investimentos dos planos que
elas administram. O órgão de fiscalização diz que é possível identificar
um mesmo "modus operandi" em investimentos suspeitos.
Auditores fiscais da Previc atuam em
parceria com o Banco Central e Comissão de Valores Mobiliários (CVM)
para buscar esse caminho perigoso. Quando há indício de crime ou gestão
temerária envolvem o Ministério Público Federal. Se comprometer o
sistema financeiro, a Polícia Federal é chamada.
O novo diretor-superintendente José
Roberto Ferreira disse que o trabalho da Previc contribui para algumas
das investigações da Polícia Federal. Questionado sobre por que em
vários escândalos aparecem corrupção nos fundos de pensão, Ferreira
afirmou que, embora a frequência seja mesmo grande, o número de
entidades mencionadas é pequeno. "Não estou relativizando, temos
situação em número muito maior do que gostaríamos", ponderou. "Essas
entidades, apesar de terem algum aperfeiçoamento de govemança, ainda têm
um caminho longo para percorrer."
Rombo. Sobre o déficit
bilionário do sistema - que chegou ao recorde de R$ 60,9 bilhões em
setembro de 2015, ante R$ 28,7 bilhões do mesmo mês de 2014 -o chefe da
Previc disse que é preocupante, mas está atrelado ao momento atual da
economia brasileira. "Apesar da dimensão que é muito grande, não vemos
uma luz amarela ou vermelha", afirmou. Os investimentos no ano passado
renderam menos do que o necessário como reflexo da recessão econômica e
do comportamento da Bolsa. A inflação alta também prejudicou os fundos a
baterem as metas atuariais.
Um plano de aposentadoria registra
déficit quando os ativos não são suficientes para pagar os benefícios
previstos até o último participante vivo do plano. Agora a regulação não
exige o equacionamento de todo o déficit. A nova norma permite que
planos com população mais jovem tenham mais tempo para administrar os
desequilíbrios.
O Estado mostrou que a mudança nas
regras diminuiu em R$ 7 bilhões o valor do rombo que teria de ser
coberto por empresas, funcionários e aposentados. As estatais -
patrocinadoras dos maiores fundos do País -foram as principais
beneficiárias. Cerca de 80% do déficit está nas mãos de dez planos,
sendo nove deles patrocinados por empresas públicas.
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