POR Malu Gaspar
06/09/2016 14:08
O mais impressionante na operação que a Polícia Federal realizou ontem para desbaratar o esquema de desvios de recursos nos principais fundos de pensão de estatais – Caixa Econômica Federal, Petrobras, Correios e Banco do Brasil – não é a quantidade de investigados, 78, e nem o total de ativos bloqueados, 8 bilhões de reais. O que espanta mesmo é que tenha levado tanto tempo para que os responsáveis pela sangria nas economias dos aposentados começassem a ser punidos. Quem acompanha esses fundos de pensão estava cansado de ler notícias sobre perdas gigantescas com investimentos superfaturados e claramente furados. A estimativa da Polícia Federal é de que, apenas nos casos ligados à operação de ontem, o prejuízo some algo como 50 bilhões de reais. As cifras rivalizam com as do petrolão – e, como naquele caso, é impossível acreditar que fosse tudo fruto de incompetência. Quem administrava todo aquele caos, porém, preferia fingir que nada estava acontecendo. Um episódio guardado na memória de ex-conselheiros do Petros, da Petrobras, ilustra bem isso.Em julho e agosto de 2015, poucos meses depois de Aldemir Bendine assumir a presidência da Petrobras, o novo comitê de auditoria da Petros começou a esquadrinhar perdas acumuladas pelo fundo de pensão dos petroleiros e a discutir formas de impedir novos prejuízos. O presidente da Petros era, então, Henrique Jäger – um ex-conselheiro do Banco do Brasil que se tornara bastante próximo de Bendine em sua gestão como presidente do BB. Fora nomeado pro Bendine no final de março para substituir Carlos Fernando Costa, um dos presos na operação de ontem.
Nas primeiras reuniões com o comitê de auditoria, Jäger deixou claro que não estava ali para promover uma caça às bruxas. Jäger admitiu que, nas gestões anteriores, a Petros perdera 25% de tudo o que aplicara em empresas privadas. O número deixou os conselheiros, também novatos na gestão do fundo, de cabelo em pé. Isso porque, nos fundos de aposentadoria de empregados do setor privado, perdas com esse tipo de aplicação não passavam de 1%. Estavam na lista de investimentos malogrados da Petros desde a famigerada Sete Brasil, empresa formada por fundos e bancos para construir e alugar sondas para a Petrobras, até uma obscura metalúrgica do interior de Minas que conseguira dinheiro da Petros para testar novas tecnologias. Hoje se vê o quão flagrante era a situação, mas, na época, Jäger forneceu uma explicação bem mais cândida: os prejuízos se deviam ao que ele chamou de “curva de aprendizado” do fundo no setor privado. Jäger afirmou ainda que a recomendação de investir 30% de todo o patrimônio do fundo em empresas privadas havia partido de uma consultoria – que, consultada, negou tudo, e afirmou ter vendido apenas um software ao fundo.
As justificativas detonaram uma feroz discussão entre Jäger e Roberto Castelo Branco, que, além de conselheiro da Petros, era também conselheiro da Petrobras. Na época, a cúpula da estatal estava em pé de guerra. Bendine se digladiava nos bastidores contra as sugestões de Murilo Ferreira, o presidente do conselho. O grupo de Ferreira acusava Bendine de falta de transparência e de querer jogar a sujeira da estatal para debaixo do tapete. Depois dos primeiros embates na Petros, Jäger se queixou a Bendine e Ferreira e ameaçou pedir demissão. Os dirigentes botaram panos quentes na crise, mas ao longo de seu mandato, novos embates aconteceriam no fundo, principalmente quando se discutia a contratação de gestoras terceirizadas para administrar o dinheiro dos funcionários (Jäger era contra). Com o tempo, algumas dessas gestoras acabaram sendo contratadas. Jäger deixou a Petros no mês passado. Foi substituído por Walter Mendes, que fez carreira administrando fundos de pensão na iniciativa privada. Tudo indica que a era dos grandes rombos deve ficar para trás. Mas quem vai pagar a conta “curva de aprendizado” serão os aposentados. De 2017 até 2033, a Petros vai descontar 800 milhões de reais por ano dos benefícios.
PIAUÍ/FOLHA
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