Moacyr Lopes Junior/Folhapress | ||
Pátio dos Correios em centro de distribuição em SP |
O Postalis, fundo de pensão dos funcionários dos Correios, contratou dois escritórios de advocacia e lobby nos EUA e abriu seis ações judiciais no Brasil para pressionar um dos maiores bancos americanos a ressarci-lo sob acusação de descumprimento contratual e de normas do mercado.
O Postalis cobra do BNY Mellon cerca de R$ 5 bilhões por suposta responsabilidade em prejuízos provocados, segundo conclusões da CPI dos Fundos de Pensão, por fraudes e aquisição de papéis com alto grau de risco.
A reportagem apurou que a direção do Postalis comunicou em reunião do conselho de administração dos Correios que colocará valor acima de R$ 1 bilhão como piso para início da negociação com os americanos. Procurado, o Postalis não comenta.
O BNY Mellon, formado em 2007 pela fusão do The Bank of New York com a Mellon Financial, tem ativos de US$ 337 bilhões e administra investimentos de US$ 1,7 trilhão em vários países.
A relação entre BNY e Postalis começa em 2010, quando fecham contrato pelo qual o banco se tornou o administrador fiduciário (espécie de supervisor ou controlador) da carteira de títulos e valores mobiliários do fundo. Para o Postalis, o banco se tornou "o responsável solidário pelos atos praticados pelos gestores dos fundos de investimento".
Nesse papel, afirma o Postalis, o banco descumpriu a legislação, "inclusive regulamentos da CVM [Comissão de Valores Mobiliários] e do Banco Central", e também regulamentos dos fundos de investimento.
Uma das cláusulas do contrato diz que o banco seria o "principal responsável por todos os eventos ocorridos no fundo de investimento, ainda que decorram de atos e fatos de obrigação de terceiro".
Em Washington, o Postalis contratou os escritórios Bart S. Fisher e Clayborne, Sabo & Wagner. O contrato prevê pagamento inicial de US$ 500 mil e "taxas de sucesso". Na hipótese de o acordo chegar a US$ 1,5 bilhão, poderiam receber até US$ 144 milhões de remuneração.
"DESASTROSOS"
Nas ações abertas no Brasil, o Postalis afirma que houve vários investimentos, classificados como "desastrosos", que deram prejuízo ao fundo.
Segundo o Postalis, desde 2005 o BNY foi administrador exclusivo de um fundo de investimentos chamado Fidex, cuja gestão coube à Atlântica Administradora de Recursos. Em 2011, o BNY disse ao Postalis que operações feitas pelo Fidex haviam se tornado alvo de apuração da CVM.
No ano seguinte, o BNY informou que títulos da dívida externa brasileira em poder do Fidex haviam sido alienados, e o dinheiro, usado para aquisição de outros ativos.
Em 2014, o BNY detectou que o patrimônio líquido do fundo perdera 51,48% do seu valor, cerca de R$ 197 milhões. Meses depois, o BNY reportou perda de mais R$ 51,9 milhões no fundo.
O Postalis entrou com ação na Justiça e obteve uma ordem de bloqueio judicial. Mas o BC encontrou só R$ 66 milhões nas contas do BNY no Brasil. A instituição então apresentou carta de fiança emitida pelo Bradesco no valor de R$ 249 milhões.
O BNY entrou com recurso contra o bloqueio, mas o Tribunal de Justiça manteve a decisão da primeira instância. O banco apresentou recursos e espera julgamento.
As operações da Atlântica Administradora são o centro de uma operação desencadeada em 2016 pela Polícia Federal e o Ministério Público Federal de São Paulo, a Positus, que prendeu gestores do fundo e identificou fraude estimada em US$ 144 milhões.
Em outro dos casos questionados pelo Postalis na Justiça, o fundo de pensão informou ter aportado R$ 100 milhões em um fundo, mas resgatou R$ 7 milhões.
Em 2015, o relatório final da CPI dos Fundos de Pensão disse que o BNY, na condição de administrador fiduciário da carteira terceirizada do Postalis e administrador de dois fundos de investimento, "concorreu diretamente para ocorrência do prejuízo financeiro ao exercer de forma, no mínimo, negligente sua função".
OUTRO LADO
O banco BNY Mellon disse que as acusações de que é responsável "por supostas perdas incorridas pelo Postalis não têm fundamento".
"Embora entendamos a motivação da administração do Postalis em recuperar supostas perdas, é preciso deixar claro que o BNY Mellon não tem responsabilidade por elas, as quais resultam, em última instância, de atos praticados pelo próprio Postalis", diz nota.
"O BNY Mellon continua aberto a diálogo sobre os assuntos-objeto das ações judiciais. As afirmações do relatório da CPI, no que se referem ao BNY Mellon, não refletem a realidade."
Em setembro de 2015, em depoimento à CPI dos Fundos de Pensão, na Câmara dos Deputados, o presidente do BNY Mellon no Brasil, Eduardo Koelle, disse: "Entendemos que não temos a responsabilidade por fiscalizar o que aconteceu, que foi uma fraude, por parte do gestor, ocorrida fora do território nacional".
Koelle disse ainda que o BNY, como administrador fiduciário, não é um gestor, não escolhe os ativos que vão compor a carteira do fundo.
FOLHA
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