Não é segredo para ninguém quem os economistas e os analistas de
instituições financeiras —o chamado "mercado"— preferem ver na disputa
presidencial do ano que vem: o ministro da Fazenda Henrique Meirelles e
os tucanos Geraldo Alckmin, governador de São Paulo, e João Doria,
prefeito da capital paulista. Mais recentemente, porém, um elemento
estranho foi anexado à lista: o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ).
O capitão da reserva passou a angariar apoio após desbancar os
preferidos do mercado nas pesquisas eleitorais e despontar como rival do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno. O próprio
Bolsonaro se deu conta do trunfo.
Enquanto Lula seguiu pelo interior do Brasil numa caravana sem paz ou
amor pelas reformas, Bolsonaro chegou a se reunir com investidores em
Nova York, apoiado pelo banqueiro Gerald Brant, da firma de
investimentos Stonehaven.
O seu novo combo econômico fala de Estado mínimo, eficiente e livre da
corrupção; prega a redução do juro para 2%; e até aceita privatizações
—algo no mínimo esquisito para um nacionalista de carteirinha que
considera um perigo o avanço global chinês.
Em 1999, em entrevista ao apresentador Jô Soares, bem ao seu estilo
controverso, defendeu o fuzilamento do ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso por privatizar a Vale e a Telebrás. Agora, como pré-candidato à
Presidência em 2018, até aceita avaliar modelos alternativos de
privatização da Petrobras.
"Bolsonaro adotou uma atitude que precisa ser olhada com cuidado, mas
que segue numa toada mais construtiva: tem sido menos polêmico", afirma
Ignacio Crespo, economista da corretora Guide Investimentos.
A guinada liberal foi recente. Em março deste ano, em entrevista à
Folha, disse ser "completamente contra" a reforma da Previdência, por
exemplo. "É um remendo de aço numa calça podre. Está muito forte a
proposta dele [do presidente Michel Temer]", afirmou. Em outubro, o tom
já era de cautela. "Dá para sair, devagar, dá."
ESTRAGO MENOR
Devagar, ele vai se tornando palatável. Em agosto, a XP Investimentos, a
maior corretora independente do país, fez uma pesquisa com 168
investidores institucionais e 400 assessores traçando cenários em caso
de vitória dos presidenciais mais óbvios.
À época, a Bolsa brasileira estava na casa dos 65 mil pontos. Para 95%
deles, a Bolsa ficaria abaixo de 60 mil pontos se Lula vencesse as
eleições. Sob Bolsonaro, esse cenário era visto por 78%. Para 31%, uma
vitória do petista levaria o dólar acima de R$ 4,10. No caso do deputado
federal, apenas 15% desenham esse cenário. Ou seja, entre Lula e
Bolsonaro, o segundo faria um estrago menor.
A própria equipe da XP estranhou o resultado. "O Bolsonaro falava em
estatizar companhias, agora diz que tem que diminuir o tamanho do
Estado. Ele gera imprevisibilidade", afirma Celson Plácido,
estrategista-chefe da XP Investimentos.
Quem tem estrada no mercado financeiro tece explicações para o fenômeno.
"Pela conversa com investidores, o Lula hoje é um problema. Pode ser
disruptivo. O Bolsonaro tenderia a causar um estresse menor no mercado",
avalia Raphael Figueredo, sócio-analista da empresa de análise Eleven
Financial.
Haveria também uma aversão ao PT. "Bolsonaro se torna mais interessante
porque não seria o PT no poder. Mesmo o Lula tendo feito um primeiro
governo favorável ao mercado, a percepção hoje é que ficaria mais fácil
com Bolsonaro montar um ministério com figuras alinhadas à atual
agenda", diz José Francisco de Lima, economista-chefe do banco Fator.
Para o cientista político Carlos Melo, professor do Insper, o que está ocorrendo é "autoenganação" coletiva.
"A visão do Bolsonaro sobre economia é zero, ele nunca teve preocupação
com isso. Mas agora ele está fazendo um discurso liberal para reduzir a
resistência do establishment econômico contra ele. É uma estratégia. O
liberalismo econômico não está no DNA dele", afirma.
Na avaliação de Melo, os dois pré-candidatos até teriam um ponto em
comum que costuma desagradar muito o mercado financeiro: "Tanto Lula
quanto Bolsonaro são intervencionistas", diz ele.
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