Em um momento de crise na base aliada, com risco de atraso e mudanças no
pacote do governo para elevar a arrecadação e cortar gastos, o ministro
Joaquim Levy (Fazenda) afirmou que a gravidade da situação financeira
do país recomenda "rapidez" na definição das medidas no Congresso
Nacional.
Para ele, o ajuste nas contas não é um fim em si mesmo, mas o trampolim para recuperar a capacidade de crescimento do PIB.
"A rapidez é essencial para a economia voltar a crescer. Em particular,
os agentes saberem a data em que, por exemplo, MPs terão seus efeitos, é
um fator importante para o resultado dessas medidas sobre as
expectativas e na arrecadação dentro do ano", disse o ministro em
entrevista por e-mail à Folha.
Alvo de críticas de políticos aliados, trabalhadores e até empresários
por causa do corte seco nas despesas, Levy indicou que não mexerá um
ponto sequer na meta de superavit primário. "Não há espaço nem intenção
de reduzir a meta de 1,2% do PIB."
Joaquim Levy aposta ainda em uma reforma do PIS/Cofins neste ano. Para
isso, porém, também precisará da aprovação do Legislativo.
ENTRAVES
As dificuldades do governo no Congresso vêm do principal parceiro da
coalizão, o PMDB. Nesta semana, o presidente do Senado, Renan Calheiros,
simplesmente devolveu ao Planalto a medida provisória que estabelecia,
com efeito imediato, a elevação das alíquotas sobre a folha de pagamento
de 56 setores.
A retaliação forçou Dilma Rousseff a enviar as mudanças por projeto de
lei, que exige aprovação do Legislativo para começar a valer.
O episódio renovou a insegurança do mercado sobre as condições do
governo de aprovar o pacote fiscal. Neste momento, agências de
classificação de risco estão no país para avaliar se mantêm a avaliação
de que o Brasil continua um lugar seguro para se investir.
O ministro da Fazenda defende as medidas adotadas até agora fazendo uma
comparação indireta com o regime que fez a presidente Dilma perder peso.
Segundo ele, uma "dieta efetiva requer comer menos e melhor". Seguindo
esta receita, diz, os "resultados aparecem" apesar do ceticismo de
alguns.
E sentencia, com direito a exclamação e tudo: "O Brasil não está doente!".
*
Folha - A economia está no chão, teremos recessão neste ano e o
governo apertou ainda mais o ajuste fiscal. Não corremos o risco de
matar o doente com o remédio administrado?
Joaquim Levy - O Brasil não esta doente! Aliás, sem cometer uma
indiscrição excessiva, deixe-me dizer que há pessoas ao meu redor que me
contam que uma dieta efetiva requer comer menos e melhor; fazendo
assim, explicam, apesar do ceticismo de alguns, os resultados aparecem.
As medidas econômicas tomadas até agora são essencialmente de diminuição
de gastos, inclusive renúncias fiscais. Ações para diminuir a dimensão
de alguns instrumentos anticíclicos, cuja eficácia vinha desaparecendo.
Alan Marques/Folhapress | ||
O governo não está muito preso ao ajuste fiscal, deixando de lado a agenda do crescimento?
O ajuste fiscal é o primeiro passo para o crescimento. Foi assim em
outras ocasiões. O emprego formal, que havia encolhido na época de maior
gasto público no final dos anos 1990, cresceu a partir de 1999, quando
começou a haver disciplina fiscal. Em geral, estabelecido o equilíbrio, a
economia dá a partida.
Como fará para aprovar as medidas no Congresso, levando em conta a tensão na base?
O Congresso tem um papel fundamental na estabilidade do país e vai saber
conduzir esse movimento, até porque sua liderança já deu mostras disso.
A mudança das metas promovida pelo Congresso no final do ano passado se
explica principalmente no contexto de preparar um ajuste rápido e
abrangente este ano. A rapidez é essencial para a economia voltar a
crescer. Em particular, os agentes saberem a data em que, por exemplo,
MPs terão seus efeitos, é um fator importante para o resultado dessas
medidas sobre as expectativas e na arrecadação dentro do ano.
Sempre pode haver o que aprimorar, e o Congresso é onde a democracia opera.
Ainda que, como comentei antes, não se esteja inventando nada, mas
apenas modulando efeitos de algumas medidas anteriores, com a presteza
exigida pela gravidade da situação financeira do país e na intensidade
ditada pelas mudanças na economia mundial e brasileira desde meados de
2014.
O Congresso reclama de não estar sendo ouvido na adoção de medidas,
como a redução da desoneração da folha de pagamento. O que o governo
fará se as medidas não forem aprovadas como foram enviadas? Há plano B?
A possibilidade de as empresas não pagarem a contribuição patronal em
alguns casos é regressiva em relação à regra geral. Especialmente para
empresas ou setores com altos salários. Vários estudos mostram também
que o custo por emprego preservado tem sido alto.
Então, apesar de o mecanismo ter dado resultado positivo no passado e
continuar sendo importante para alguns setores abertos à competição
externa ou da informalidade e de pequenas empresas com regime tributário
favorável, seu ajuste era necessário e oportuno. Dentre as alternativas
para reduzirmos o gasto com renúncias esse ajuste é dos menos
impactantes.
Como acelerar a retomada?
É evidente também que haverá oportunidades de trabalharmos com o
Congresso em várias matérias econômicas, como na reestruturação do
PIS/Cofins. O ideal para o PIS seria as mudanças serem votadas ainda
este ano para entrarem em vigor em janeiro de 2016, sem perda de
receita.
Se consolidarmos rapidamente as medidas anunciadas nos dois últimos
meses poderemos em breve trabalhar com o Legislativo para chegarmos a um
projeto de lei do PIS/Cofins horizontal, transparente e com o mínimo de
exceções. Isso aceleraria a retomada da economia.
O governo pode reduzir sua meta de 1,2% de superavit neste ano diante das dificuldades no Congresso?
Não há espaço nem intenção de reduzir a meta de 1,2% do PIB.
A presidente fez reparos às suas declarações sobre a desoneração da
folha de pagamento, mas reconheceu que você está comprometido com o
resultado fiscal. Neste período de convivência com a presidente, qual
sua avaliação sobre o comprometimento dela com os ajustes que estão
sendo feitos na economia?
Ela tem dito e demonstrado total comprometimento com o ajuste da economia. O ajuste é a plataforma para voltar a crescer.
O sr. reforçou o ajuste preocupado com a nota do Brasil. Um ajuste
tão recessivo não estaria focando demais na nota de crédito do Brasil e
menos no ambiente político para aprovar as medidas no Congresso?
O Brasil expandiu bastante o crédito nos últimos 15 anos. Isso permitiu
muita gente ter acesso a bens e serviços antes inalcançáveis. Abriu
espaço para as empresas investirem e micro e pequenos empresários
aproveitarem as oportunidades do mercado. O preço e tamanho do crédito
privado dependem da qualidade da dívida pública. A nota soberana não é
um assunto apenas de quem investe na "renda fixa". É de todo mundo.
A indústria deve demitir. Há alguma ajuda em curso para evitar desemprego?
Em janeiro, a indústria contratou. Mas queremos um ciclo sólido de
crescimento. As mudanças de preços relativos que estamos vivenciando e
as iniciativas que estão vindo vão ajudar a indústria no período à
frente.
O dólar segue pressionado, o que vai pressionar ainda mais a inflação. Este é um preço do ajuste em curso?
O dólar tem se apreciado no mundo todo. Tem gente que acha que uma
desvalorização cambial resolveria tudo no Brasil. Mas um antecessor meu
tinha um quadrinho nessa sala (no Ministério da Fazenda) que dizia em
letras maiúsculas que "para todo problema difícil tem uma solução
fácil". E, lá embaixo, em letras minúsculas, bem minúsculas, estava: "em
geral inadequada".
Não tem uma medida mágica para reequilibrarmos a economia. O governo fez
movimentos moderados em varias áreas, reduzindo os subsídios do BNDES,
fazendo uma programação de gastos dos ministérios disciplinada,
alinhando o preço dos combustíveis, acertando as contas no setor
elétrico, atacando brechas que podiam distorcer a concessão de pensões
por morte, e modulando a renúncia fiscal.
Um conjunto bem distribuído, que vai permitir à economia tomar pé com
confiança e os preços relativos encontrarem um equilíbrio saudável.
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