O barraco na praça dos Três Poderes e o listão dos parlamentares ocupam a
atenção e dominam as conversas daquilo que um dia se chamou de
"formadores de opinião" (formam a opinião uns dos outros). Devem afetar
também o povo que assiste a tudo isso bestificado ou enojado, mas que em
geral tem mais o que fazer ou acompanha essas turumbambas a uma
distância desesperançada ou cínica.
No entanto, parece que pelo menos por agora se esquece que a vida fora
do universo paralelo de Brasília anda bem prejudicada e piorando, o que
por fim, de resto e óbvio, vai realimentar um dos motivos fundamentais
da crise, o desprestígio popular da presidente Dilma Rousseff.
Muito se trata das macroeconomias e políticas politiqueiras do ajuste
fiscal, mas pouco se tem lembrado que a conta está caindo nas costas de
pessoas reais. Somado aos efeitos da inflação, de outro ano de queda da
renda nacional, de juros mais altos e menos empregos, o ajuste fiscal
talvez tenha mais efeitos políticos do que o listão do Janot.
Uns três decretos de aumentos recentes de receitas podem tirar de
empresas e consumidores o equivalente a 1,3 Bolsa Família. Ou 75% de um
mês de toda a massa de salários paga nas seis maiores regiões
metropolitanas do país, aquelas acompanhadas pela Pesquisa Mensal de
Emprego do IBGE. Como esses talhos de renda têm efeitos secundários (são
"multiplicados"), o estrago é muito maior.
Há os aumentos de impostos ou de receitas. Por exemplo, considere-se a
Cide, o impostos dos combustíveis. A gasolina 22 centavos mais cara não
causa uma revolução, embora o aumento do diesel tenha contribuído para
levar caminhoneiros a fechar estradas.
Causa uma irritação difusa, aparentemente, menor, visível em redes
sociais. Mas, no "agregado", tudo somado, contribui para um talho anual
de mais de R$ 17 bilhões no bolso de quem consome esses combustíveis. O
governo federal deve arrecadar uns R$ 12,2 bilhões com a volta desse
imposto, pois transfere parte dessa receita para Estados e municípios.
Uma paulada mais visível será a das contas de luz, embora a gente ainda
não saiba o tamanho final dos reajustes. Sabe-se que o governo vai
cancelar todos os subsídios que bancava com, no final das contas,
dívida. Ou seja, o governo vai deixar de gastar repassando ao consumidor
a conta dos dinheiros que passava às empresas de energia. No ano
passado, foram quase R$ 12 bilhões. Neste ano, na estimativa do projeto
de Orçamento o gasto iria a R$ 9 bilhões (a conta desse fundo de
despesas do setor elétrico, CDE, é de R$ 22 bilhões para este ano). Há
gente no governo a dizer que a paulada, no final das contas, chegue a
pelo menos R$ 10 bilhões.
O aumento do IOF, do Imposto sobre Operações Financeiras, parece quase
invisível diante da conta de juros aberrante de qualquer financiamento
no Brasil. No entanto, tudo somado, dá mais de R$ 7 bilhões.
Cide, IOF e conta extra de luz, somados, dão, portanto, uns R$ 34
bilhões, por baixo. Sobre gente que vai ganhar menos, pois haverá menos
aumento real de salário, se algum, para nem mencionar o desemprego. O
povo não vai ficar apenas bestificado
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